12 / Enchendo o tanque na Bolívia.


De manhãzinha, um taxista e eu saímos de Rio Branco, capital do Acre, e como destino tínhamos a cidade fronteiriça de Assis Brasil, na divisa com o Peru. É o próprio Rio Acre que divide os dois países nesse trecho.

No caminho, há uma entrada à direita para Xapuri. A cidade é o reduto do PT nesse pequeno estado e tem fama internacional por ter sido a cidade de Chico Mendes. Nos seringais lá de perto ele iniciou sua carreira política, voltada para a conservação das florestas e de seus habitantes, principalmente os seringueiros, como ele. Em sua própria casa foi cruelmente assassinado.

Vale a pena visitar o pequeno museu, bem perto do Rio Acre, que conta a história da colonização do Estado, o ciclo da borracha e a guerra com a Bolívia. De lá copiei em meu diário as seguintes informações e acontecimentos históricos. O mérito é todo dos curadores do agradável museu:

· Manuel Urbano da Encarnação foi o primeiro que subiu o Rio Acre até suas cabeceiras procurando uma comunicação fluvial com os afluentes do rio Madeira. Antes só havia índios;
· Sírios e Libaneses eram os verdadeiros fenícios da Amazônia;
· Revolução Acreana: Plácido de Castro e Barão do Rio Branco;
· No acre o extrativismo da borracha estabeleceu relações sociais, culturais e políticas profundas entre os homens e entre esses e a floresta;
· Em 1985, foi o primeiro Encontro Nacional dos Seringueiros, liderado por Chico Mendes. “Resistir contra o desmatamento que transforma a floresta em pasto”;
· Poronga: é lanterna de querosene que os seringueiros carregam na cabeça;
· Índios, ribeirinhos e seringueiros se juntaram formando a Aliança dos Povos da Floresta, também liderada por Chico Mendes.

Perto da saída do museu (tudo é perto na pequena Xapuri) há uma pracinha central de onde se avista o quase seco Rio Acre. De uma caixa de som que fica ligada o tempo todo saía um funk carioca: “de ladinho agente gosta”. Fez-me lembrar que ali ainda era o Brasil.

De volta a estrada o que se vê é poeira, gado, castanheiras e fumaça.

As castanheiras são proibidas de serem derrubadas. De nada adianta, porque depois que a floresta vira pasto elas morrem do mesmo jeito. Segundo meu motorista, naquele dia:

- São tão bonitas que dá até vontade de fazer amor com elas.

Paramos em Epitaciolândia para almoçarmos e também porque tinha que dar saída na Polícia Federal para entrar no Peru com a documentação correta. Passamos para o lado boliviano, numa cidade chamada Cobija, em busca de gasolina barata. Por motivos “políticos”, para não dizer “diplomáticos”, brasileiros estavam proibidos de abastecer em qualquer posto oficial, a não ser os que compravam um cartãzinho que lhes dava o direito de abastecer uma certa quantidade dez vezes durante um certo período. Sei que não valia a pena adquirir o tal cartãozinho, ao menos pro meu motorista. É claro que uma proibiçãozinha dessa não nos impediria de comercializar com nossos vizinhos, ainda mais se tratando de combustível. Ele conhecia o irmão de uma mulher que trabalhava num dos postos de gasolina e que vendia o combustível em frente a sua própria casa.

- Melhor ainda! - Ele me disse. Assim ainda arrumo mais uma namoradinha boliviana. - Todo à vontade na sala da moça.

Com gasolina boliviana e carro brasileiro chegamos em Assis Brasil antes do anoitecer. Ainda tive tempo de atravessar o Rio Acre, com a água nas canelas, para procurar um transporte até Porto Maldonado, Peru adentro.